sábado, 19 de novembro de 2016

Trabalho Vocacional


Questões da Faculdade de Pedagogia (sobre vocacional):
1.    Caberia a volta do vocacional hoje?
2.    Você conhecia essa experiência em educação pública de qualidade e em período integral?
3.   Em sua opinião, as práticas e técnicas do vocacional ainda podem ser aplicadas hoje em dia?
4.    Você teria alguma sugestão voltada para a educação do futuro?
5.    No seu entender como deveria ser a educação para os jovens deste século?
6.    Leia com atenção:
A educação praticada ainda hoje nas escolas está baseada em processos que remontam aos séculos XIX (equipamentos como quadro negro, giz, lousa, apagador, copias, ditados e etc) e instrutores e técnicos com formação efetuada no século XX para jovens do século XIX. Responda: Como será possível superar esses paradigmas?

Respostas:
1.    O formato de ensino configurado pelo vocacional ainda se configura em nosso ensino moderno sob diversos aspectos. Sem dúvida que foi um processo de renovação na época em que foi desenvolvido (1962/1969), período em que o ensino até então não era em nada democrático, mas após diversos reveses e diversas contribuições de educadores diversos, as diretrizes educacionais elaboradas nos últimos anos tem tentado acompanhar os princípios basilares do vocacional e muito de seu formato. A educação que visa a formação da autonomia e do desenvolvimento crítico dos sujeitos, numa pedagogia que desloca o foco do professor para o aluno, do ensino para o aprendizado, incentivando a mediação, o trabalho coletivo e desenvolvimento de projetos é a realidade que temos hoje, de modo literal em escolas particulares e circunstancial em escolas públicas de todo o país. Como professora do estado de SP e do município de São Paulo, percebo a similaridade nestes traços comuns que remontam e remetem à educação dos ginásios vocacionais.
2.    Sim. A primeira vez que ouvi falar a respeito do vocacional foi em 2003, durante minha permanência no Projeto Redigir, na ECA/USP em que tínhamos aulas de redação e cidadania, por assim dizer, em formato bem similar a este, diga-se de passagem. Este projeto era voltado para alunos de ensino médio. O resultado final deste curso que se desenrolou por meio de um projeto resultou num livro chamado “Democracia para todos”, sendo que ao longo de todo o período éramos estimulados a pensar e agir de crítica e autonomamente, porém, engajados em união com os demais, pois o grupo tinha objetivos em comum para alcançar.
Quando iniciei meus estudos da graduação voltei a ouvir a respeito e me lembro de ter tido um colega na sala que tinha um parente (não me lembro qual parente) que foi aluno do vocacional e ele sempre falava a respeito. Essa troca para mim foi muito rica, pois certamente graças a ela é que ao estudar a história de nossa educação jamais deixei de ponderar a respeito da contribuição que o grupo das classes experimentais vocacionais deixaram em nossa educação.

3.          Como já mencionei, percebo que diversas técnicas e práticas do vocacional não só podem como são utilizadas hoje, e para nós atualmente soa como normal, natural ou apropriado, bem diferente de como soava antes: algo muito revolucionário, esquerdizante e nefasto, ao menos àqueles que brigaram pelo fim destas práticas pedagógicas. Nosso ensino está estruturado em eixos temáticos, há os temas transversais perpassando todo o currículo, temos aulas extra classe, com atividades em campo, em museus e parques, por exemplo. Temos todo um esforço para o desenvolvimento e implantação de projetos nas escolas, projetos multidisciplinares e interdisciplinares, e inclusive com a gradativa permanência dos alunos na escola, visando a educação integral. Na rede municipal, as notas até o ano passado eram dadas em conceitos: P (plenamente satisfatório), S (satisfatório) e NS (Não satisfatório). A partir deste ano os conceitos permanecem aplicados para os 3 primeiros anos do Ensino Fundamental, sendo que para os demais foi adotada a escala numérica de notação de 1 a 10 (zero é inviável). O método de conceituação remete ao estilo vocacional. Há também momentos de auto avaliação, que são sempre estimulados. Essas práticas seriam impensáveis antes de 1962, e podemos pensar que é a partir daí que começaram a ser exploradas.
É certo também que se em métodos podemos nos aproximar dos vocacionais, em muito da essência e da ideologia podemos nos afastar. O ensino permanece oscilando entre propedêutico e técnico, e alguns valores basilares não são trabalhados com a mesma ênfase, ou em alguns casos, não são vislumbrados de maneira alguma, como a busca para a emancipação pessoal, o sentir-se bem em tornar-se uma pessoa livre em pensar e agir, ser dono de seu próprio nariz, apto a fazer aquilo que julgar melhor a si e ao mundo. A primazia por essa atitude emancipadora (que também nos remete a Paulo Freire entre outros educadores progressistas, por exemplo) não é mais mister em nossa educação, apesar de por vezes, ainda servir de pano de fundo para campanhas políticas de alguns oportunistas...

4.     Sugiro que a educação do futuro redescubra a importância de se trabalhar os valores, estas pérolas basilares da educação, capazes de promover uma educação integral, íntegra e integradora dos sujeitos. Assim poderá formar pessoas de bom caráter e fraternas, mais aptas a conviver em sociedade, pois cada vez mais nossa sociedade requer o desenvolvimento de competências promotoras de paz, de união, de pessoas que consigam trabalhar bem em equipes, que consigam se relacionar bem com seus pares. Estas coisas infelizmente, permanecem relegadas em nossas escolas atualmente.

5.    Os jovens deste séculos precisam desenvolver mais habilidades sociais, e mesmo interpessoais, pois estão visando cada vez mais as habilidades técnicas e tecnológicas. Os jovens cada vez mais querem transformar-se em máquinas e é comum desejarem ser como elas ou mesmo superá-las. As relações humanas estão cada vez mais frias e superficiais, e como resultado disso, as desconfianças aumentam, há maior foco nos resultados e menos no processo. Estes jovens moldam a educação do mesmo modo que são moldados por ela, que não raro desponta como reflexo disso tudo: cada vez mais competitiva, propedêutica, tecnológica, superficial. É preciso que ressurja com força a característica integradora da educação, como outrora existiu, mas se hoje o contexto é outro é preciso que haja também outros moldes para que essa característica desponte. Os educadores devem considerar o que é preciso, refletir sobre isso, sobre o que falta na educação atual. A partir daí devem traçar parâmetros, e claro, evidentemente em conjunto, para a elaboração de metas e de estratégias para que estes parâmetros sejam atingidos. Não há como se obter uma educação integradora quando já toda uma classe de educadores se desponta fragmentada e em desarmonia, cada um falando uma língua própria, por assim dizer, fazendo de seu ensino individual um mastro e se tornado cada um uma ilha. A educação do futuro precisa ser integrada e penso que integração, portanto, seja uma palavra chave. Trabalhar em rede, o que já vem sendo feito em alguns níveis sutis, também é chave, e vale para hoje e para amanhã.

6.    Esse discurso de que os recursos pouco mudaram e que isso tem atrasado nossa educação não é de todo verdade. Muitas profissões deram grandes saltos sem grandes mudanças em seus recursos. Muitos métodos científicos, por exemplo, permanecem sendo os mesmos e válidos há séculos, mas a ciência em si, tem dado pulos a galope. Podemos utilizar esta linha de pensamento e adequá-la para realidades diversas, relacionadas a diversas profissões e contextos. O entrave da educação não está no giz e na lousa, tão pouco nas cópias, hoje em dia ainda largamente utilizadas, mas sobretudo, no processo.
      Podemos pensar que grandes educadores, grandes filósofos, grandes cientistas, matemáticos etc deram grandes aulas e utilizaram cópias, giz, apagador, e que ainda assim deram também grandes contribuições com seus talentos. O que eles tem em comum conosco? Alguns diriam que apenas os recursos materiais...E pode ser verdade. O dote, o talento, o viço, o comprometimento com o ensino é muito mais comprometedor dos resultados que os recursos materiais. O que ocorre é que enquanto algumas áreas tiveram incentivos diversos para evoluírem dentro de seu âmbito, a educação não confabulou disso. E o que é pior: além de não progredir a educação tem sofrido duros revezes e um desprestígio gigantesco tem se abatido por ela, de um modo geral, recaindo sobre seus educadores e influindo até mesmo em seus ideais. A sociedade não olha mais com os mesmos olhos para a educação, e apesar de também achar que não deveria olhar com os mesmos olhos (porque a conjuntura agora é outra), deveria manter o apreço e a estima que sempre a mantiveram forte.
        Hoje em dia os profissionais da educação não são valorizados pela classe política, pelo cidadão comum, pai e mãe de aluno que frequenta a escola, e obviamente, menos ainda por este que lá está, que já adentra os muros dela levando toda a influência que traz de fora e a refletindo lá dentro, tornando professores cada vez mais desmotivados para dar aula. Isso sem dúvida, conspira contra a educação.
Grandes educadores tem uma característica em comum: trabalham motivados. Os educadores do vocacional (e outros tantos) sempre mantiveram seus ideias e queriam colocá-los em prática e conseguiam, na medida do possível, tinham incentivo, vontade, e se nutriam porque os educandos também tinham o desejo de aprender, tinham em si despertado a curiosidade, vontade e a disposição, que como dizia Freire é vital para a educação, é vital para aprender. O que distingue um cientista, ou um médico de um professor, é que os pacientes torcem para que seu médico saiba cada vez mais, torce para que ele estude mais, se desenvolva mais, saiba mais, por saber que eles mesmos (os pacientes) serão beneficiado. Prestigiam o médico por interesse. Mas e quanto ao professor? O que espera atualmente, a mãe de um aluno desse profissional? Se um professor ficar um mês de licença para ir a um congresso e for substituído por outro profissional, ainda que tenha a mesma qualificação, quanto não serão desprestigiados pela mãe do aluno e pelo aluno o professor substituto quanto o que se ausentar? Mas e se um médico for a um congresso e marcarmos a consulta após sua volta, ficaremos satisfeitos e podemos até nos gabar de estarmos com um médico “de nível, que preste, competente”. O que não evoluiu na educação foi a mentalidade da sociedade que acabou regredindo e é esse o maior fator para o atraso educacional, pois uma vez que toda uma sociedade e poder público não se interessam em voltar esforços para a melhoria e avanço de uma área, ela só pode seguir aos trancos e barrancos, e sobreviver a duras penas pela lei maior da sobrevivência.
Só superaremos esse paradigma cada um de dentro pra fora e todos em uníssono, fazendo coro por uma educação de qualidade que possa ser motivo de orgulho de todos. Afinal, a educação valorizada beneficia a todos, até aos que não se dão conta disso.


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